Hoje é dia de falar de João Soares do Amaral, o monsenhor que foi homenageado com nome de rua e escola, foi um dos heróis na epidemia de febre amarela em 1900 e grande inspiração para o grande João de Camargo.
João Soares nasceu em Sorocaba na Rua Direita em 8 de março de 1844, o sexto filho do português Francisco Soares de Queiroz e de Francisca Amália do Amaral, tendo como avós paternos José Soares de Queiros e Maria Fogaça de Almeida e avós maternos José do Amaral Gurgel e Ana Eufrosina Aires.
Quando tinha 2 anos sua família se mudou para uma casa na Rua das Flores.
Foi aluno dos cursos preparatórios de francês e latim ministrados pelo Professor Toledo.
Em 1863 entrou no Seminário Episcopal de São Paulo.
Recebeu Ordens Menores em 18 de fevereiro de 1866.
Foi subdiácono em 14 de outubro de 1867.
Teve sua ordenação em 23 de maio de1869 no Rio de Janeiro, aos 25 anos.
Em Porto Feliz foi coadjutor até outubro de 1869.
Durante aproximadamente 10 anos foi vigário em Sarapuí até 16 de fevereiro de 1879. Nessa época que o escravo João de Camargo conheceu o ainda jovem padre Amaral e ficou fascinado pela vida religiosa e pela dedicação do padre com a igreja e a população, aprendendo algumas maneiras rituais que futuramente aplicaria em sua igreja Nosso Senhor do Bomfim em Sorocaba.
O respeito e a admiração que João de Camargo tinha pelo monsenhor, fez se presente com uma pintura dele em sua igreja e na aquisição de uma cadeira que era do antigo padre e adquirido de seus familiares depois de sua morte.
Em Itapetininga, Monsenhor João Soares foi pároco também por 10 anos até 8 de outubro de 1889, auxiliando o término da construção da igreja matriz.
Transferido para São Paulo retornou para o Seminário Episcopal, agora como reitor, ficando até 5 de fevereiro de 1895.Para ajudar na situação precária que a instituição se encontrava, além de receber doações dos ricos paulistanos, construiu uma série de casas para alugar sendo necessário abrir uma rua que se chama atualmente Rua São Caetano.
Foi pároco em Santa Cruz do Rio Pardo até 25 de dezembro de 1895.
Em 1896, o Bispo de São Paulo, Dom Arcoverde decidiu fundar em Sorocaba, o Ginásio Diocesano e comprou um dos sobrados dos Lopes de Oliveira na Rua Souza Pereira, onde atualmente se encontra o Colégio Santa Escolástica para sede da escola, trazendo Monsenhor João Soares para ser reitor, inaugurando-o em 4 de abril, masque funcionou apenas por um ano, terminando com um incêndio que destruiu o ginásio nos dias 6 e 7 de março de 1897, seguido do inicio 1ª epidemia de febre amarela, na qual atuou de forma heroica para combatê-la.
Foi pró-pároco em Sorocaba de 25 de julho de 1897 até 21 de fevereiro de 1900 e nesse período reformou a matriz.
Em 2 de fevereiro de 1899, esteve presente junto de Padre Luiz no concerto realizado pelo Centro Musical Sorocabano em prol da matriz.
Nessa mesma época , durante a investigação sobre o crime de Julieta Chaves, monsenhor acalmou os ânimos da população que queria linchar um possível suspeito que esteva preso na cadeia. Durante sua intervenção disse:
“Quem sabe o verdadeiro criminoso está entre vós. Esperemos a justiça desvendar o crime. Talvez um inocente pague pelo pecador”.
Com a população apaziguada indo embora, sai dela um individuo que vai cabisbaixo até ele e beija sua mão. Passado alguns dias confirmando o que disse a população, o verdadeiro assassino que era o mesmo homem que beijou sua mão, e foi preso na cidade de Piedade.
Com o fim do Ginásio Diocesano continuou morando no prédio até 1900 e o utilizou como hospital durante a 2ª epidemia de febre amarela, atendendo atenciosamente todos os enfermos.
No auge do surto da epidemia em 29 de janeiro de 1900, fez uma procissão para trazer da Capela de Aparecidinha em meio à lama e ao transbordamento do Rio Sorocaba, a imagem de Nossa Senhora Aparecida para o centro da cidade. Em frente à matriz rogou de joelhos pedindo pelo fim da mortandade que afligia a cidade.
Pouco tempo depois realmente a epidemia se extinguira controlada pelos sanitaristas, mas para no imaginário do povo, somente a prece do vigário foi a responsável por esse milagre milagre.
Durante a epidemia, monsenhor foi auxiliado pelo padre José Raimundo e pelo Padre Luiz indo de casa em casa, socorrendo os enfermos das formas que precisassem: cuidados físicos aos acamados e espirituais. O Bispo Dom Antônio Alvarenga tendo conhecimento das noticias sobre Sorocaba decidi vir ajudar, em companhia do Frei Daniel de Santa Maria de Gardena para ministrar extrema unção para os doentes necessitados.
Nesse período monsenhor já estava morando na casa da irmã na Rua São Bento onde depois seria construído o Teatro São José, e lá hospedou Dom Antônio Alvarenga.
Mesmo doente atendia enfermos dia e noite, e por isso era vigiado à noite pelo casal de criados que moravam com a irmã e ficavam dormindo em frente à porta dele, mas que não adiantava, pois fugia pela janela para atender a população.
Depois de dois meses de incessante trabalho na epidemia, ele sucumbiu e deitado em sua cama tendo Dom Antônio Alvarenga em sua cabeceira diz:
“Senhor Bispo não posso mais! Tome Vossa Excelência conta da paróquia, eu vou dormir”.
Morreu em 21 de fevereiro de 1900, vítima da febre amarela. Seu corpo foi levado discretamente à noite para o Cemitério Municipal num ambiente triste e desolador, que como Aluísio de Almeida conta “era como essa última vitima, valesse por outras mais, colocando fim a esse flagelo”.
No Museu da Arte Sacra de São Paulo existe uma pintura a óleo de Carlos de Servi de 1903, intitulada “Extrema Unção”, baseada na cena da morte de Monsenhor João Soares, onde se vê Dom Antônio Alvarenga, Padre Luiz e Frei Daniel assistindo-o em seu leito de morte. Faltou na pintura o padre sorocabano José Raimundo da Silva, que também esteve presente durante o seu falecimento.
Para ele foi construída uma sepultura no Cemitério da Saudade, um modesto túmulo de mármore das jazidas que existiam naquela época em Itupararanga.
A Câmara Municipal e a Intendência decidiram homenageá-lo mudando o nome da Rua das Flores para Rua Monsenhor João Soares.
Em 29 de maio de 1902, o professor e jornalista Ferreira Junior do Jornal 15 de Novembro, escreve um artigo homenageando Monsenhor João Soares e toda a sua coragem durante a epidemia de febre amarela, que culminou em sua morte.
Em 1944, foi realizada uma campanha feita por Jurandir Baddini Rocha do Jornal Cruzeiro do Sul, para fazer uma comissão para homenagear o centenário de Monsenhor João Soares com a criação de um busto de bronze. Essa comissão teve uma grande participação da população destacando-se: prefeito José Fernal, Monsenhor Francisco Cangro, Jurandir Baddini da Rocha, Doracy Amaral, Conego Luiz Castanho de Almeida, Frei Tadeu Strunk, Comendador Pereira Inácio, Severino Pereira da Silva, Joaquina Cunto Scarpa, Luiz Pinto Thomaz, Aníbal Ferreira Prestes, entre muitos outros.
No dia 8 de março, as comemorações se iniciaram com a realização de uma missa na catedral celebrada por Dom Aguirre, seguido por uma romaria até seu tumulo no Cemitério da Saudade finalizado com um discurso de professor Renato Sêneca Fleury.
Às 8 horas da noite foi inaugurado na Praça Cel. Fernando Prestes o busto que foi confeccionado pelo escultor Ernesto Biancalana, com discursos do professor Jorge Moises Betti e do prefeito José Fernal. Esse busto tinha em sua base duas placas sendo a primeira com uma parte da pintura de Carlos de Servi, que citamos anteriormente, a segunda sobre com dizeres sobre homenagem do centenário e data da inauguração.
O local onde foi instalado o monumento é próximo aonde existia o relógio de sol, feito em Ipanema e que hoje se encontra na Uniso da Rodovia Raposo Tavares.
Durante a reforma da praça central em 1985, o busto foi realocado para a Rua Carlos Gomes, próximo a Rua Padre Luiz em frente ao jardim atrás da catedral. Em 2003 foi retirado novamente da praça por uma nova reforma, mas dessa vez só retornou para a praça em 2011.
Durante esse período, em 2004, houve a possibilidade de colocado entre as ruas da Penha e Monsenhor João Soares, mas os riscos de vandalismo e acidente, tornando a possibilidade inviável.
Retornando para praça recebeu uma nova placa sobre o centenário, mas não encontramos nenhuma informação sobre a placa com a pintura de Carlos de Servi que não foi recolocada.
O Arcebispo Dom Duarte Leopoldo e Silva que foi aluno de Monsenhor João Soares também erigiu um busto de bronze em sua homenagem o colocando no jardim do Seminário Central do Ipiranga em São Paulo, mas não conseguimos confirmar o atual paradeiro desse busto.
Na década de 40, Sorocaba ganhou o Grupo Escolar “Monsenhor João Soares” na Avenida General Carneiro, atualmente o grupo escolar se tornou uma escola estadual com uma nova localização na Vila Lucy com fundos para Avenida Afonso Vergueiro.
Curiosidade 1: Conta-se que o monsenhor recebeu um envelope fechado de uma doação referente a um batismo de uma criança rica e que colocou no bolso , sendo depois abordado por uma pobre mulher que ali pedia ajuda. Na hora entregou o envelope tinha. Assustada com a pequena fortuna que tinha dentro do envelope, a pedinte quis devolver para ele, que recusou a devolução e nem quis saber quanto havia, pois não tinha feito por engano.
Curiosidade 2: Em 2013, durante uma reforma na Escola Estadual Júlio Prestes de Albuquerque (Estadão), foi encontrado a lápide de Francisca Amália do Amaral, mãe de Monsenhor João Soares no porão. Segundo a história levantada pelo Jornal Cruzeiro do Sul, é que Francisca foi enterrada no Convento Santa Clara, mas sua lápide foi encoberta por uma camada de piso que só foi descoberto na demolição do convento. Foi levado para o Museu Histórico na Rua Padre Luiz, mas com o posterior fechamento do museu todo seu conteúdo foi encaixotado e guardado no porão dessa escola. O diretor do museu, na época, era o professor Renato Sêneca de Sá Fleury, que lecionava no Estadão. Supõe-se que este seja o motivo para ter levado todo o material do museu para o porão da escola. Quando o museu foi reaberto e retiraram todo material para o casarão de Quinzinho de Barros, a lápide deve ter ficado para trás. Na reportagem cita que a lápide foi destinada ao Museu Arquidiocesano de Arte Sacra de Sorocaba.
Curiosidade 3: O primogênito da família Soares do Amaral, José Manoel , comerciante de animais, comprou uma casa ao lado do futuro Sorocaba Clube e foi moradia da família Amaral por muito tempo, depois foi demolida para a construção do sobrado em que morou o prefeito Alcino de Oliveira Rosa e atualmente se encontra parcialmente demolida, restando apenas a fachada de frente com a Rua São Bento.
Curiosidade 4: Monsenhor Claro, veio visitar o colega antes de sua última doença. Trazia um fonógrafo e gravava em seus rolos. Pediu para que Monsenhor Soares que cantasse, que risse ou recordasse uma anedota diante do fonógrafo, porque queria levar a voz do amigo, que era sempre tão jovial. “- Ora, Claro, como é que eu hei de estar alegre, quando meus paroquianos sofrem?” - responde Mons. Soares. E em frente ao aparelho registrando, recitou uma oração sentida e triste, a refletir-lhe da nobreza de alma. Mas o futuro catequista começou a contar anedotas. Nesse instante ouviu-se a casquinada gostosa de Monsenhor Soares. - Agora sim! Concluiu que padre Claro levou a sua rizada paro o sertão.
Fontes:
Arquivos de Rogich Vieira;
Jornal Cruzeiro do Sul - 21/02/1962; 01/07/1966; 19/03/1974; 26/01/1986; 04/04/2004; 17/07/2011;
Correio Paulistano – 26/08/1954;
Livro: João de Camargo de Sorocaba – O Nascimento de uma religião de Carlos de Campos e Adolfo Frioli;
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